Cartilha Caligráfica

do brilho solto na asa da ave desenhada,
da rota ideogramada envolta,
e por isso alça um voo sempre humano e válido.
quando o artista realça o poder do gesto
tão ancestral cultura ao desenhar cavernas
ou repor no papel da tecnologia
o semblante de deus recriado.
das cores essenciais, decisivas e fortes,
este humanismo gráfico e definitivo
tem da sabedoria chinesa o gosto
pelo mínimo e prático,
e o resumo da natureza sem destino vário.
o artista é apenas isso, o náufrago,
não há no mar vestígio de uma ilha
ela flutua na criação em ritmo acelerado
num ritual de amar, de vida.
neste caso não foi apenas navegante
que se perdeu do barco comum, a vez da vela
e a desenhar por que conhece o amplo espaço
em que ela se imagina transparente e tesa.
a fina ideologia desta arte preocupa
a fera, e não a vez da presa,
sobre o feroz brilho destes dentes de sabre
se esconde uma loucura sem violências vivas,
pois em tudo nela habita a tez da mágica,
desde o pré-histórico gesto herdado
quando o homem só falava ao redor do fogo

(Bené Fonteles)